"A extrema diversidade das situações de degustação, desde a vinha até a refeição entre amigos, pode ser reduzida a um quadro geral.
A situação mais frequente, que é o consumo razoável em família ou entre amigos, pode se valer de algumas praticas simples que permitem melhor perceber, julgar, apreciar e saborear.
Essas "boas práticas" também são uteis para escolher os vinhos a serem comprados.
Em primeiro lugar, o cenário. Para degustar bem, o mais adequado é um ambiente simples, suficientemente iluminado por luz solar ou equivalente, sem cheiros fortes.
O vinho deve estar a temperatura correta ou ser levado a ela ficando algumas dezenas de minutos em balde de gelo. A temperatura adequada para os vinhos brancos e/ou leves é de 8 a 12-14 ºC e para os vinhos tintos de 16-18 ºC. É frequente esses limites serem ultrapassados, sobretudo para os vinhos tintos, muitas vezes servidos quentes demais.
O copo de degustação deve ser simples, com capacidade de cerca de 200 ml, sem floreios, de paredes finas, sem cheiro de guardado nem de pano de prato. O copo ISO de degustação e suas variantes é muito apropriado. Com líquido a um terço de sua capacidade, permite a leve agitação necessária para liberar as moléculas odoríferas do vinho.
O degustador é, evidentemente, o essencial, ao mesmo tempo "ferramenta", objeto e sujeito da degustação. Nesse campo é necessário e suficiente ser dotado, ter disposição para trabalhar e motivação. O gosto pelo bom vinho é a motivação que convida ao trabalho e, na verdade, há muito poucos subdotados sensoriais. Na pratica, o essencial é a atenção. Durante alguns segundos o degustador pensa apenas no que está vendo, sentindo e provando em seu copo. Esquece o que está à sua volta, suas preocupações, e "escuta" o vinho que lhe "fala". Essa escuta também serve como aprendizado, como formação continua por toda a vida.
A degustação propriamente dita compõe-se de algumas fases principais:
O GOLPE DE VISTA. Em alguns segundos, veem-se a limpidez, a intensidade da cor, seus matizes ou tons e, conforme o caso, eventuais depósitos, bolhas discretas ou intensas, nos vinhos efervescentes.
O GOLPE DE NARIZ. Acima do vinho agitado no copo revelam-se os cheiros, suas intensidades, suas naturezas, sua evolução. Esses cheiros são nítidos, sem odores estranhos ao vinho como o mofado do BOUCHONÉ ou "gosto de rolha" (caso mais frequente)? São intensos ou fracos? Simples ou múltiplos? Qual é o cheiro principal?
O GOLPE DE LÍNGUA. Colocam-se na boca alguns ml de vinho e faz-se o liquido circular lentamente em contato com a língua, durante cinco a dez segundos, raramente mais do que isso. Percebem-se ao mesmo tempo os sabores dominantes e seu equilíbrio. Quando há esse equilíbrio, há harmonia e revela-se u,a eventual nota dominante de acidez, de álcool, de adstringência tânica. Em caso de excesso, há desequilíbrio, desarmonia mais ou menos intensa e desagradável.
Depois de bebido, o vinho revela novos aromas, percebidos pela via retronasal, ou seja, pelas moléculas odorantes que vão da boca para o nariz. Percebe-se sua persistência, sua presença na boca e o equilíbrio geral entre todos os sabores e cheiros.
Tal como o silencio depois da musica de Mozart, que ainda é Mozart, o vinho que desaparece continua presente durante alguns segundos. Em dez a vinte segundos de atenção total o degustador "analisou" seu vinho: ele o compreendeu, pôde apreciá-lo e saboreá-lo (ou recusá-lo!). Voltar a provar satura as papilas e não substitui uma falta de atenção!"
O trecho acima foi extraído na integra do livro "Le Goût du Vin - Le Grand Livre de la Dégustation" de Émile Peynaud e Jacques Blouin, para mim uma obra essencial e definitiva em sua simplicidade.
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